17 setembro 2020

Ambrose Bierce - Dicionário do Diabo


O livro Dicionário do Diabo de Ambrose Bierce na Edição da Carambaia, 2018 tem tradução e apresentação de Rogerio W. Galindo. Bierce traz em seus verbetes críticas ácidas às instituições, culturas, categorias e também aos indivíduos. Galindo sintetizou o livro nessa frase: a misantropia em verso e prosa.  

A primeira edição do livro data de 1881, com o título Vocabulário do Cínico. O livro reúne textos/verbetes que ele havia publicado em jornal e acumulado durante 25 anos na temática contra a soberba e a arrogância humana.


Alguns exemplos de verbetes:


Aborígenes: (aboriginies), s.2g.pl.

Pessoas de pequeno valor encontradas penando sobre o solo de um país recém-descoberto. Em breve elas deixam de penar; passam a fertilizar. 


Desobediência (disobedience), s.f 

O lado positivo da servidão.


Perda (loss), s.f

“Aqui jaz sir Huntington, voltou ao pó.

A perda que teve foi a nossa vitória,

Pois quando vivia, em toda a sua glória,

O que ele ganhava perdíamos nós”. 


*Collis P Huntington (1821-1900), magnata das ferrovias.

Ps: Huntington estava vivíssimo quando esse verbete foi escrito. 


Um excelente livro, que vale a pena ser lido!


Abaixo meu vídeo comentando esses e outros verbetes do livro:





06 setembro 2020

EDUARDO GALENO - O LIVRO DOS ABRAÇOS


“Um conto toca um ponto

de alguém que precisa urgentemente 

de uma palavra materializada” 

(Everton Marcos Grison)


Estou insuportável, confesso. Nem eu mesma me suporto ultimamente. Nada me agrada. Nem as coisas que costumavam me agradar. 

Ando desanimada com o mundo. É tanta violência, corrupção, impunidade. Estamos indo a passos largos para nossa própria destruição e parece que ninguém vê. Se vê, está cansado demais de nadar contra a corrente. Ou é andorinha solitária, que não pode fazer verão.

Em meio a uma pandemia, o que prevalece é o egoísmo. O bem estar pessoal antes do bem estar coletivo. Dane-se você, vou fazer o que eu quiser. Isso é defender a liberdade? Pode haver esperança - não pra nós, já dizia Kafka.

As veias abertas da América Latina sangram como nunca. Mas não só elas. O mundo inteiro vem sendo dilacerado dia após dia.

Salva-me, como sempre, a arte. E um bom conselho do marido: “Você precisa de um abraço, leia o Galeno.”

Na mosca! Saiu um sorriso só de lembrar desse livro, que me aquece o coração.

Eduardo Galeano (1940-2015), foi um escritor uruguaio que conseguiu com uma precisão cirúrgica e uma beleza indescritível trazer em seus livros as memórias de um povo, torná-las vivas e eternas, como devem ser. 


“Recordar: Do latim re-cordis, tornar a passar pelo coração.”


A função da arte/1


Diego não conhecia o mar. O pai, Santiago Kovadloff, levou-o para que descobrisse o mar.

Viajaram para o Sul.

Ele, o mar, estava do outro lado das dunas altas, esperando.

Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas alturas de areia, depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus olhos. E foi tanta a imensidão do mar, e tanto fulgor, que o menino ficou mudo de beleza.

E quando finalmente conseguiu falar, tremendo, gaguejando, pediu ao pai:

- Me ajuda a olhar!”


(Trechos de: O Livro dos Abraços, de Eduardo Galeano)


        Galeano, com sua arte, me trouxe um sopro de vida. Um oásis onde repousar a alma.

       Em tempos de desesperança, não preciso de ilusões, muito menos do grito da desgraça. Tenho necessidade vital do silêncio da beleza.


Se quiser ver mais textos e comentários, assista o vídeo:





04 setembro 2020

Ilusão x Desilusão

 Ai quem me dera uma feliz mentira 
que  fosse uma verdade para mim!
J. Dantas

Arte: Débora Bacchi


Em tempos pandêmicos, a reflexão acaba se tornando mais constante, mesmo para alguém como eu, que não tem muita paciência. Vide as circunstâncias tumultuadas do mundo ao nosso redor, o melhor mesmo a fazer é tentar sossegar a mente e entender algumas coisas dentro da gente primeiro.

Foi então que me peguei a pensar em algumas palavras. Gosto de brincar com elas, sou escritora, palavras são meu instrumento de trabalho e minhas companheiras. Devido a algumas situações ocorridas nos últimos tempos, cheguei a palavra ilusão. 

Para mim, ilusão tem um sentido ruim, significa que você não está percebendo as coisas da maneira como elas realmente são, ou seja, está se enganando. Sendo essa palavra negativa - ao meu ver, fui levada instintivamente a pensar num antônimo. Cheguei em desilusão, que literalmente acabou com minhas esperanças. 

Se ilusão era engano, desilusão era decepção, desapontamento. Encontrei-me numa encruzilhada. Seriam as duas palavras ruins? Alguma delas poderia ser boa? 

Um ilusão nos deixa felizes com uma mentira. Uma desilusão nos deixa tristes com a verdade. É melhor ser alegre que ser triste? Ou é possível alegrar-se pela tristeza causada pela desilusão?

A vida não precisa ser tão cartesiana a ponto de nos obrigar a uma única escolha. Gosto de ter minhas ilusões (ou não seria escritora, muito menos professora!) e gosto de perdê-las de vez em quando também, porque não quero ser feita de trouxa. 

Sair do País das Maravilhas às vezes é necessário, mas ter um ranchinho dentro dele pra passar um tempo é espetacular!