11 março 2010

DICAS EXTRAÍDAS DO LIVRO O ULTIMO LEITOR

Como eu já disse ontem, o livro "O Último Leitor" de David Toscana, nos traz muitas reflexões sobre a maneira de escrever um romance. Nele o persongagem principal, Lucio, dá dicas do que gosta e do que não gosta nos livros que leu.

Logo nas pgs 11 e 12 ele faz sua primeira crítica ao romance fictício entitulado: "As cores do Céu" de Brian MacAllister

(...) " Sabe o que o espera, traste dos infernos? O negro negou com a cabeça embora sua expressão de horror revelasse que sabia muito bem o que o esperava. Os dois o levaram à barreira e o fizeram ver com terror as àguas que Murdoch acabava de observar com prazer. O negro parou de lutar. Preferia acabar com tudo de uma vez por todas a continuar aguentando a humilhação de ser arrastado como um cachorro, desviando-se das fezes dos cavalos, ouvindo conversas de bêbados. Você quer dizer alguma coisa antes de enfrentar seu destino?, perguntou Murdoch. O negro disse que sim e, tentando fazer com que sua voz não tremesse, falou: Há um Deus que não diferecia as cores da pele, que ama igualmente negros e brancos... Lucio bufa e fecha abruptamente o livro. Duzentas páginas para que esse negro venha dar lição de moral feito uma freira."

em seguida faz mais algumas colocações sobre a superficialidade de algumas expressões como "horror":

(...) "Uma mulher passa com meio quilo de tortilhas, e Lucio fica com água na boca. Ela o cumprimenta com um sorriso sem palavras; ele responde que MacAllister é um incompetente, e agora em voz baixa, só para si, continua: Olhe que mencionar a expressão de horror do negro e não se aprofundar nisso... devia ter dito como tremiam seus lábios vermelhos e grossos e rachados com fios de baba, ou pelo menos como a lua brilhava no branco dos seus olhos. A palavra horror é uma ilusão do escritor, pretende criar uma tensão inexistente, porque é obvio que o negro não vai morrer, tudo é tão óbvio (...)

Na pg 14 Lucio dá mais algumas dicas sobre o uso de nomes estrangeiros nos livros:

"Abre um livro e começa a ler. Tomou cuidado para que fosse um romance recente, pois estes não se preocupam mais em escrever os detalhes de um prato (...) no dia anterior já tinha descartado um romance desses. O narrador se sentava à mesa e dizia: Sara escolheu uma explêndida garrafa de Château Certan-Marzelle 98 para acompanhar a salada périgourdine, a cocotte de porc à l'ananas e o brie de Coulommiers, e como sobre mesa mandou que fossem servidos crêpes aux moules preparados com um magnífico vin de paille. Essas linhas e a descrição que seguia sobre mais quitutes e garrafas e vocábulos em itálico não provocaram a menor reação no seu estômago. Para mim, com esses nomes estrangeiros, dá na mesma se estão falando de comida ou de peças de reposição para uma máquina; as garrafas poderiam ser de óleo e talvez cocotte fosse uma engrenagem. Censurou o romance na página trinta e nove."

Na página 19 continua:

"Para não parecer muito ansioso, Lucio abre de novo "O Outono em Madri" e passa, por uns segundos, os olhos pelas frases. Natália, minha Natália, eu lhe disse umas cem vezes que a cidade é uma vitrine na qual se exibem minhas tristezas, minha falta de você, minha incapacidade de perceber qualquer beleza que não venha do seu rosto. Para mim basta dizer uma vez só, diz Lucio e tira da gaveta o carimbo de censurado.

Por outro lado, na pg 24 ele elogia o final do livro "A morte de Babette" que termina com essa frase: "Sinetas, gritos e sinos; gritos dentro e gritos fora e mais sinos, pobre Babette, pobre de você, sinos e mais sinos, um país que acredita que é livre, uma menina que não acredita em nada. Uma história não pode terminar assim, protesta Remigio. Claro que pode, e não há dúvida sobre o final. Pierre Laffitte já diz isso no título, então evita repeti-lo na trama."

E também na pg 27 fala do livro "Os peixes da terra" no qual ele finalmente encontra algo que lhe é familiar, algo que condiz com sua realidade, (...) "não ficou seduzido pela trama sobra Fritz e Petra, um casal que visita vários lugares em busca de um local para viver (...), no entanto, quando estava prestes a abandonar a leitura, o casal chegou a um lugar que Lucio teve certeza que era Icamole." (cidade onde ele morava)

Para finalizar o post de hoje o comentário muito pertinente da pg 33, quando Lucio está falando do romance "A macieira": "E pensar que estive a ponto de censurar esse romance, diz Lucio, só se salvou porque o pênis do protagonista é curto, e isso me parece insólito; em geral os escritores querem se ver em seus personagens e falam em enormes membros e amantes perfeitos e ereções monstruosas."

Amanhã mais dicas com esse ótimo livro do David Toscana!

Abraços!

Um comentário:

Alexandre Lobão disse...

Gostei muito das frases "pinçadas" do romance, realmente dão muito o que pensar para quem pretende escrever algo que envolva os leitores!

Obrigado pelas dicas!

[]s